terça-feira, 19 de junho de 2007

Maria VII

Escrevo com força enquanto o papel me atravessa a cabeça e corre para outros pastos, onde talvez me deite e cheire uma papoila. A cliente, baixa e anafada, caracois quase ausentes na planície descoberta da idade, começa e soltar urros e sussurros, a discrição de quem quer mostrar que está ali e que alguma coisa a diverte. Que quer esta agora? Para além do registo da entrada e da chave com o número cravado a negro. Continuas até eu olhar para ti não é?
- É engraçada a maneira como a menina escreve!
Como não me lembrei disto antes, desde que cheirava a madeira das velhas escrivaninhas que relinchavam de dor sempre que torcia os dedos e desenhava de forma errada. A caneta encosta à barriga do polegar que pisa o médio, o indicar e o anelar, os três lado a lado. depois vem o mindinho que está solto debaixo de tudo resto. Desde os laços vermelhos, desde o leite com chocolate no intervalo das 10, que as minhas mãos se moldavam assim nos lápis de cor e de cera, nas canetas, bic e de feltro. Até agora que sou magra, pálida e fumo que nem uma cadela. Tento com que os meus lábios se mexam perante os dentes sujos de massa e o vestido apertado, igual a um cortinado que a minha avó tinha na sala de jantar. Sê simpática.
- Sabe do que é?
Esta é nova, a origem, desconhecia qualquer causa religiosa ou médica para esta minha diferença.
- Não...
- Isso é a menina que devia ter sido canhota e contrariou ou foi contrariada e agora agarra assim com a mão direita. Não vê que só os canhotos escrevem assim com a mão curvada. Uma amiga da minha afilhada é tal e qual, e disseram-lhe isso, que engraçado.
- Nunca tinha ouvido.
E calquei o pensamento, [já há desconforto quando não minto] não me é mesmo familiar esta versão, aliás toda a vida pensei que era apenas uma questão de jeito, no início soube a mel e adaptei-me assim. Afinal contrariei um fado.
- Boa estadia!
Não estiques mais que a boca tem um limite. Olho a minha mão esquerda, pequena e atrofiada como sempre a vi, mas agora sei que a força foi morta por mim e neste pequeno pulo em que cheiro um malmequer sinto-me mais alta.

1 comentário:

Anónimo disse...

uhm...maria e miguel...ambos deficientes a escrever...