terça-feira, 12 de dezembro de 2006

Diogo II

Toda a concentração posta no grande vermelho desliza de repente para a dor insuportável, que pode estar ali desde de sempre mas só agora parece disposta a sorrir-lhe. E ri.Tem que sair, e tentar lavar o que espreme o corpo. De uma só vez levanta o tronco ficando de joelhos sobre a cama que lhe parece invulgarmente dura. Tudo rodopia e assobia sobre Diogo, tudo são sombras de chão e paredes, dançando e dançando. Tudo pára, tudo anda de novo a seu ritmo.Vislumbra o quarto onde está. As paredes são de um verde escuro, queimado pelo tempo e pela sujidade que suja o ambiente. Todo o ar é amarelo e morto, sustentado por uma fresta de mundo que fura as duas persianas do seu lado direito. Duas mesas de cabeceira, a dos despertadores (o grande vermelho parece-lhe agora tosco e vulgar) e uma outra onde está o que parece ser uma caixinha de música. Uma porta aberta, deixa ver uma sanita, reconfortada na base por um tapete grosso em tons de rosa. Senta-se então colocando os pés na realidade, feita de azulejos verdes, com flores que se enleiam e desenleiam num labirinto complicado para qualquer mente dolorida. Está descalço, tem os pés sujos e manchados pela ausência de qualquer recordação. Repara então num velho guarda fatos que olha para ele com um ar miserável de desconsolo e reprovação. Por fim ergue-se em tudo o que tem e dirige-se para a porta aberta em busca de um lavatório, de água. Depois dos primeiros goles, algo de mau acontece. A sua cabeça desce tão fundo que pensa todo ele habitar naquela sanita, bordada pela sujidade e podridão.

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